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Quando a Mamba dorme a onda malgaxe leva!

Desta vez não foi no “fatídico” minuto 92, mas a meio da segunda parte, em seis minutos, que a Mamba, com a eliminatória “no papo” adormeceu e a onda malgaxe levou.

– Ao intervalo, o Presidente Simango da FMF, afirmou que o estarmos a vencer por 3-0, “reflectia a diferença de nível entre o Moçambola e o campeonato malgaxe”.
– No final do jogo, a Ministra da Juventude e Desportos, Nyelete Mondlane, referiu que é necessário repensar o nosso futebol, pesquisando talentos nas camadas jovens.

Estes posicionamentos, reflectem alguma falta de profundidade nas nossas análises e a dificuldade de passarmos das intenções à prática, aos vários níveis. O que a segunda parte do jogo trouxe à tona é a realidade: lugar 116 no ranking FIFA, “clientes assíduos” das pré-eliminatórias e, como se não bastasse, cada vez mais dificuldades para ultrapassar adversários que há poucos anos nos temiam.

Daí que, se tivéssemos mantido o 3-0 até ao final da partida, a esta altura estaríamos a colocar o nosso futebol nos píncaros.

UMA REVIRAVOLTA
“QUE JÁ NÃO SE USA”

O espaço para lamentações começa a fartar. Aquela reviravolta, já não se usa na alta competição. Orientações como investir na formação e buscar talentos, viraram “slogans” que nada alteram.  O que nos falta? Passar das palavras às acções – pensadas, programadas e cumpridas.

Efectivamente, teremos que dar razão ao ditado que diz que quando o camarão dorme, a onda leva. É o que está a acontecer. Acobertados pela ideia de que “abundam talentos e é só pesquisá-los”, acções pensadas e planificadas vão sendo subalternizadas.

A realidade está aí. O futebol de Madagáscar, Maurícias, Lesotho, Namíbia, Comores e por aí fora, que ao que tudo indica não parou no espaço e no tempo, vai-nos surpreendendo. Neste caso, basta repararmos na evolução da constituição física da Selecção malgaxe, comparada com a dos primeiros clubes e selecções daquele país que nos visitaram, para equacionarmos um dos pontos da evolução do vizinho.

ALGUNS DOS “NÓS”
DE ESTRANGULAMENTO

Só ao fim de muitos anos, nos convencemos que a medida tomada pelo Estado, de proibir a transferência de jogadores nacionais para o estrangeiro – dizia-se que não são uma mercadoria – estava errada. Acabámos, nessa vertente, por tentar “acertar o passo” com o que é normal lá fora.

Hoje, diferentemente do que aconteceu a Gil, Luís,  ngelo Jerónimo, Orlando Conde e muitos outros, as portas parecem escancaradas para “exportar” atletas, até para clubes de divisões secundárias, não sendo necessário “saltar o arame”.

Os nossos craques – particularmente os do futebol e basquetebol – já iniciam as suas carreiras com um horizonte amplo, pois o profissionalismo de alto nível, além dos rendimentos pecuniários, dá prestígio ao indivíduo e ao país.

PROFISSIONALISMO PELA METADE

Vivemos um profissionalismo pela metade. Os números existem, as contratações acontecem, mas os valores envolvidos, ao contrário do que acontece pelo mundo fora, permanecem no segredo dos deuses.

Vejamos: se um qualquer cidadão pretender aceder às contas do Manchester United, Benfica, Sporting ou qualquer outro clube de gabarito, fá-lo com relativa facilidade. As grandes transferências e os salários das estrelas são públicas e publicitadas. Mas nós continuamos a pautar pelo secretismo absoluto, apesar de o dinheiro que o desporto movimenta, ser maioritariamente desembolsado pelo Governo – directamente ou através das empresas públicas – e como tal produto dos impostos dos cidadãos.

Equacionemos este cenário: se a direcção de um clube integrado ou patrocinado, quiser destinar a maior parte da receita que lhe é alocada na formação, invertendo a actual pirâmide em que só “migalhas” é que vão para esse sector, seguramente que não conseguirá levar o seu propósito a bom porto.

Os “donos do dinheiro” dificilmente estarão de acordo com um plano – por mais bem elaborado que esteja – de investir numa movimentação séria e orientada para os jovens, pois só produzirá efeitos a médio e longo prazos.

A pressão virá de vários quadrantes, incluindo dos sócios. Daí que a solução mais cómoda seja contratar “craquezitos” de um país vizinho, para chegar a resultados rápidos.

E o assunto torna-se mais complexo se a colectividade fôr do norte ou centro do país. Aí, contrata-se um treinador de renome, juntam-se os rejeitados dos grandes clubes do sul e concretiza-se o desiderato de estar presente no Moçambola. É por isso que por lá já não brotam jogadores como Joaquim João, Tayobe, Nuro Americano, Paulito e outros, titulares da Selecção Nacional forjados e temperados nas suas zonas de origem, antes de virem para a capital. Actualmente, chegam e sobram os dedos de uma mão para indicar, em cada equipa nortenha os craques, formados localmente.

PARAR NÃO É SOLUÇÃO

Temos pela frente, um “edifício” complexo e que nem o Governo, nem a maioria dos cidadãos se predispõem a colocá-lo no lugar que merece: o desporto, como um assunto de Estado.

Sentimos – particularmente no futebol – que os moçambicanos vivem, com extrema paixão, o desporto-rei que se movimenta pelo mundo, reservando apenas pequenos espaços do seu dia-a-dia, para tecer críticas ao nosso “futebolzinho”.

Mas a ideia de “parar para repensar”, seguramente não é o melhor caminho. Estaríamos a “enterrar”, os modelos de que dispomos, reduzir para a juventude as razões para ela sentir como suas as estrelas locais.

A solução passa por trazer à luz do dia, o que cada entidade desportiva destina à formação e à competição, com regras claras de que, sem matar o presente, se investe no futuro.
Afinal, se desporto é saúde e educação, se incentiva o turismo e

dá prestígio ao país, porque é tão subalternizado, numa Pátria que quando era colonizada produzia estrelas de nível mundial?

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