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Paulina Chiziane acusa Ndjira de se apoderar dos seus livros  

A escritora acusou, esta sexta-feira, na Cidade de Maputo, a editora Ndjira de se apoderar dos seus livros e de os imprimir sem o seu consentimento. Paulina Chiziane rescindiu o contrato com a Ndjira em 2011.

Semana passada, Paulina Chizina ‘passeou’ pela Cidade de Maputo e, inevitavelmente, passou por uma livraria. Ao entrar, viu que lá estavam à venda alguns livros seus, editados pela Ndjira. Até aí, parece tudo normal. Mas não é, afinal, em 2011, a autora de O sétimo juramento rescindiu o contrato com aquela editora por causa de algumas questões com as quais não se identificava. Por exemplo? “Balada de amor ao evento é um livro com 30 anos. Nunca a editora se lembrou de sentar com a autora para perguntar se precisa de rever alguma coisa. Os outros livros, de vez em quando abro e leio e descubro que há algumas alterações daquilo que foi por mim escrito. Então, o livro que está a sair de quem é?”

A pergunta da escritora é retórica, mas a indignação é bem real, tão real que Paulina Chiziane resolveu denunciar o que define como um desrespeito ao seu trabalho, pois, 10 anos depois do contrato rescindido com a Ndjira, as obras pela autora escritas continuam a serem impressas pela editora sem o seu consentimento. Assim, ano passado, Paulina Chiziane voltou a “gritar e a dizer basta!’. Segundo disse, esta sexta-feira à noite, sentada em sua casa, na Cidade de Maputo, não a querem ouvir e, por isso, os gritos a plenos pulmões. “Não me informam de nada. Como é que uma editora chamada Ndjira apodera-se de um trabalho que é meu?”

A segunda pergunta retórica de Paulina Chiziane serviu, nessa ocasião, para a contadora de histórias fazer uma pausa, como que a puxar o ar para serenar as emoções. Como escritora que é, Paulina segurou uma esferográfica de tinta azul e, num caderno preto de capa dura, pequeno, daqueles que os meninos utilizam na escola secundária, pareceu escrever algumas linhas. Não passaram de duas. A seguir, voltou à carga, dessa vez, para convocar mais uma entidade à conversa: o Governo. “Não tem o controlo sobre nada. Que eu saiba, os nossos textos fazem parte dos livros escolares. Não me recordo de um dia ter ouvido um escritor moçambicano dizer ‘que recebi alguma coisa pelo facto de o meu texto ser sido publicado num livro escolar’. Mas, numa conversa que tive com um ministro da Educação, fiquei a saber que existe esses acordos em pagamentos. Então, para onde vai o dinheiro que o Estado dá às editoras para se produzir o livro escolar com os textos do autor?”.

Sem resposta, Paulina Chiziane entende que os escritores são tratados como marginais. “Mas nós trabalhamos e alguém está a ganhar com isso”.

À pergunta por que coloca esta questão agora, na imprensa, Paulina Chiziane lembrou que tem mais de 30 anos de carreira. “Se sou tratada assim, como é tratada uma escritora ou um escritor que acaba de surgir? Não estou feliz com o que se passa com algumas editoras moçambicanas e, concretamente, com a Ndjira. Porquê me ignoram? Porquê usam o meu trabalho. Quer dizer, o meu nome está no livro, mas eu nem tenho a garantia de que o que está no livro fui eu que escrevi. Há aqui um problema que precisa de ser resolvido com muita urgência. Vivemos dificuldades, mas somos trabalhadores. Nós recolhemos a memória de um povo e fazemos a arte”.

E a pergunta que não quis calar? A Ndjira cumpre com os pagamentos dos direitos do autor? “Eles de vez em quando mandam umas coisas que chamam de mapas de venda. Mas o que eu sei sobre isso? O que me garante que aquilo que dizem ser, é? Por isso optei em ter o controlo sobre o meu trabalho, em 2011. Quando eu digo que não, lá estão eles a reeditar. Aliás, nem é reeditar. Aquilo é reimprimir. Quem os autorizou a reimprimir aquilo que é meu? Não sei dizer. Estou desapontada e peço ao Ministério da Educação, ao Ministério da Cultura e aos artistas para intervirem em defesa de quem trabalha na cultura”.

Além de sublinhar que há mais de 30 anos que não sabe o que é receber um pagamento pela publicação de um texto seu num livro escolar, Paulina Chiziane lembrou que o livreiro ganha, o estado desembolsa e o produtor (escritor) fica a pedir esmola. Farta disso, a escritor também ‘gritou’ para que os novos autores não atravessem esse caminho sinuoso que dura uma vida.

 

A REACÇÃO DA NDJIRA

A Ndjira respondeu às questões com rapidez e clareza, quando contactada para reagir à indignação de Paulina Chiziane. Numa chamada telefónica, o representante da editora, Pedro Macedo, reconheceu o problema apresentado pela escritora, pediu desculpas em nome da Ndjira e prometeu a editora vai resolver a situação de modo satisfazer a reivindicação de Paulina Chiziane.

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