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Os contornos de uma noite com guitarra ao peito

“– Ni-ceeee!”. Esta foi a resposta do público, dada de forma breve, em coro, à pergunta “what’s up, Maputo?”, feita por aquele multi-instrumentista que se encontrava no palco montado no Campus Universitário da Universidade Eduardo Mondlane. Era o Bona, que, depois de provar da gastronomia moçambicana, lá apresentou-se à segunda edição do Noite de Guitarra, tocando “Kalambacoro”, do álbum Munia: The tale.

Nunca se viu um camaronês tão adepto de matapa como Richard Bona. A paixão pela verdura é tanta que o baixista não se importa em repetir vezes sem conta. “Eu como matapa pela manhã, à tarde e à noite”, revelou o músico minutos depois da sua actuação. Há-de ser por isso que o autor de “Dipama”, do soberbo álbum Tiki, apresentou-se aos moçambicanos, neste regresso ao país, com um sorriso bem nutrido. Nem mais, era da matapa. E pela força proporcionada pelas folhas de mandioca misturada com outros ingredientes, Richard Bona, acompanhado da sua banda (guitarrista, trompetista, baterista e um no teclado), fez Maputo passear numa odisseia sonora feita de África, das imagens do continente pintadas com padrões universais. No baixo, o menino (agora adulto) que começou a tocar aos quatro anos de idade, tendo-se iniciado à guitarra aos 11 e, dois anos depois, formado uma banda, expressou o seu universo interior, com aquelas músicas pausadas, falou dos sentimentos que nutri por Moçambique e, antes de sair do palco, ainda abraçou o público à distância.

Quem não quis saber de abraços fictícios neste regresso do Noite de Guitarra – evento organizado pela BDQ Concertos, com forte patrocínio da Vodacom e do Banco ABC, e que é feito sobre a umbrella da plataforma Moments of Jazz da mesma entidade, que já trouxe ao país Billy Ocean, Norman Brown, Gerald Albright, Marcus Miller e George Benson – foi Jimmy Dludlu. O guitarrista moçambicano foi o último, dos quatro convidados ao espectáculo, a subir ao palco. Trajado de fato azul celeste e, como é habitual, com um chapéu à cabeça, preto, o menino de Chamanculo, superando o desempenho dos seus colegas, fez levantar até os que se julgavam estar a ver o concerto à vontade, estando sentados no VIP.

Sempre irrequieto, alegre e ao estilo homem do povo, Jimmy rapidamente abandou o palco e lá foi ter com a sua gente. No meio da multidão, enquanto tocava, o guitarrista ofereceu abraços, deixou-se fotografar em selfies e quase saiu de órbitra quando reconheceu, talvez, um velho amigo: o músico estava diante de Jeremias Langa, quem também não se poupou num abraço amistoso, electrizante.

No seu tempo de espectáculo, o “Achemist” tocou músicas bem conhecidas. São os casos de “Linda” e “Tote”, essa música recriada pela cantora Lizha James noutros tempos. E houve tantas lindas, de todas as cores, que quiseram o músico por mais tempo. Jimmy tocou corações no Noite de Guitarra, conhece bem o seu público, e ainda mostrou que em questões de dança nada lhe passa ao lado.

Além de Jimmy Dludlu e Richard Bona, em palco esteve também o anunciado Ernie Smith, quem há muito não actuava no país. Foi, por isso talvez, o guitarrista que muito impressionou. Houve, durante a actuação do sul-africano, entre os mais entendidos de afinação musical, uma espécie de paixão à primeira vista. Algo recíproco. O bafana tratou logo de explicar: “Amei o público moçambicano. Ele, realmente, ama a música. Eles amam aquilo que fazemos e fazem-nos libertar a música que há em nós. Este é um dos melhores lugares do mundo onde já actuei”.

Ao lado destes monstros, todos da música africana, também tocou e cantou Albino Mbié. Foi quem abriu o concerto, às 20h, cumprindo o desafio de se colocar ao nível dos maiores nomes que têm participado na plataforma Moments of Jazz, em geral, e no Noite de Guitarra, em particular. Para quem não conhecia, deve ter notado que há muita coisa que liga Mbié ao seu antigo professor, Richard Bona: a serenidade com que canta, por exemplo, músicas como “Mbilo & Kaya” e “Awusiwana” (com a qual se despediu do público), ambas do se disco de estreia: Mozambican dance.

Sobre a sua participação no concerto, Albino Mbié foi categórico: “fiquei surpreendido com a qualidade do show, do público e da produção. Foi um espectáculo de revelar que Moçambique pode produzir e também trazer bons músicos ao país. Foi uma grande honra fazer parte deste show”.

A segunda edição do Noite de Guitarra encerrou com a actuação dos quatro músicos em palco, com passos de dança ao estilo Michael Jackson, como já se tornou hábito ver do Jimmy Dludlu.

Mais de três mil pessoas estiveram no evento da BDQ Concertos.

 

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