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OEM deplora proliferação de universidades de engenharia sem qualidade e que vendem diplomas

A Ordem dos Engenheiros considera que há escolas e hospitais que constituem um perigo à vida, devido a irregularidades de construção. A ordem defende que a situação é facilitada pela proliferação de universidades de engenharia sem qualidade no país. Os posicionamentos foram deixados, hoje, durante um encontro com o Presidente da República.

Num ano em que a Ordem dos Engenheiros completa 20 anos de existência, o Presidente da República reuniu, na Ponta Vermelha, a classe para falar dos desafios das diversas áreas ligadas à engenharia. Para o vice-presidente da ordem, os problemas que se vivem hoje partem da academia. “Temos a universidade que o senhor Presidente bem conhece (UEM), se for lá visitar, verá que há equipamentos novos, mas não são usados por falta de uma pequena peça. O que acontece é que os estudantes estudam sem a componente prática e engenharia não se ensina com teorias e equações”, introduziu Alberto Tsamba, vice-presidente da ordem para quem o Estado não está a apostar na área da docência, o que está a influenciar na qualidade dos profissionais que saem da academia.

“Os docentes que existem nessas faculdades são pessoas que não tinham emprego. O Governo investe na formação de docentes no exterior e, quando eles voltam, já não servem à educação, porque o mesmo Executivo os nomeia PCA. Nós temos que ter a honestidade de dizer a certos indivíduos que não servem como formadores, sendo que devem procurar outro emprego”, precisou.

O Bastonário da Ordem dos Engenheiros foi mais profundo, criticando o que chamou de falsos engenheiros e exigiu do Estado maior regulamentação da área de engenharia para impedir que o país esteja a ser prejudicado pelos maus empreiteiros.

“TEMOS QUE EVITAR QUE O DINHEIRO PÚBLICO SEJA ATIRADO FORA”, BASTONÁRIO DA OEM

“Temos que regular esta área de engenharia, senhor Presidente, principalmente nesta componente de obras públicas. Temos que evitar que o dinheiro público seja atirado fora”, iniciou Feliciano Dias, para, em seguida, acusar as ONG de apadrinharem, no seu entender, a má qualidade de algumas obras.

“Muitas vezes, elas não querem saber sobre as matrizes de projectos de construção existentes no país nas áreas de educação e saúde e impõem um modelo de construção que não se adequa para o local. Há escolas primárias e centros de saúde que são extremamente perigosos, porque a sua construção não obedeceu a regras. Por isso, quando há ciclones, os tectos não suportam e destapam as casas. Temos também o problema do copy and past. O que construímos em Maputo, queremos copiar para a cidade da Beira e Quelimane. Mas os solos de Maputo são diferentes dos que existem nessas duas cidades. Os solos de Quelimane e Beira são argilosos e os lençóis freáticos muito altos precisamos de sapatas maiores e, se a sapata não responder a essa exigência desse tipo de solo, esse edifício irá sofrer”, defendeu.

“HÁ AQUI A PROLIFERAÇÃO DE VENDA DE DIPLOMAS”, DIZ DIAS

Para a ordem, há proliferação de universidades que têm cursos de engenharia, mas de qualidade não tem quase nada. “Temos 26 instituições que leccionam cursos de engenharia no país, atrevo-me a dizer que isto é muito para a população que temos. Temos que redimensionar o ensino de engenharia. A Austrália tem 13 universidades, a África do Sul tem também o mesmo número e nós temos 26. Há aqui a proliferação de venda de diplomas e precisamos de ter cuidado com isso, senhor Presidente”, terminou.

 

MESQUITA FICOU ASSUSTADO COM ANTIGUIDADE DE EQUIPAMENTOS NO LABORATÓRIO DE ENGENHARIA

Carlos Mesquita, ministro das Obras Públicas, interveio no encontro e lançou duras críticas, tendo avançado que o assunto de obras públicas é sensível, tendo apontado fragilidades até internas. “A minha primeira visita, como ministro das Obras Públicas, foi ao Laboratório de Engenharia de Moçambique. Falamos muito de qualidade e vemos esse componente como produto final, mas isso começa quando estamos a desenvolver projectos. Onde está o Laboratório de Engenharia? Confesso que fiquei por muito tempo esquecido. Na minha visita, encontrei 80% dos mesmos materiais que usei como estudante em 1983. Hoje em dia, os empreiteiros já têm laboratórios móveis. E se calhar o nosso laboratório nem sabe interpretar aquelas máquinas ou usar aquele equipamento”, iniciou o dirigente.

Mesquita queixou-se da desonestidade e falta de seriedade de alguns empreiteiros que os chamou de “lobistas”.

“Há duas semanas, fizemos uma amostra de 144 empreiteiros, aqui da Cidade de Maputo. Deste número, 77 decidiu-se que a solução era de fazer cassação da licença, pois não estavam devidamente documentados, nem tinham recursos humanos qualificados. Os restantes do universo serão sancionados por várias irregularidades. Se na capital estamos assim, como vamos pedir qualidade no centro e no norte. O que funciona aqui é ‘lobismo’. Temos consultores que não têm experiência nenhuma e trabalham em obras. Não têm biblioteca, nem cultura de leitura. Outrossim, temos que discutir sobre a qualidade dos materiais que entram no país. Como é que eles entram no nosso território, quem faz a aprovação, quem fiscaliza as características do projecto? Temos que trabalhar juntos para melhorar essa situação”, defendeu Mesquita.

MORENO DIZ HAVER FALTA DE RIGOR NA ATRIBUIÇÃO DE LICENÇAS

Para Silvino Moreno, ministro da Indústria e Comércio, que fez parte do primeiro elenco da Ordem dos Engenheiros, defendeu que o problema das obras públicas provém, em parte, da falta de rigor no licenciamento de empreiteiros.

“O problema dos empreiteiros parte do tipo de licença que nós concedemos. Não há rigor no processo de licenciamento dos empreiteiros. A escolha de empreiteiros que existe é derivada do nosso sistema de licenciamento para a constituição de empresas de construção civil. 80 por cento das empresas existentes em Nampula, onde trabalhei por muito tempo, não têm técnicos qualificados de construção civil, não falo de engenheiros, mas de técnicos que são os mesmos que são usados pelas ONG para a construção de infra-estruturas”.

NYUSI DEFENDE COMBATE À CORRUPÇÃO COMO UMA ARMA PARA ACABAR COM DESMANDOS NA ÁREA

Já no fim, o Presidente da República, que também é membro 521 da Ordem dos Engenheiros, reconheceu os problemas apontados e defendeu que a corrupção é um mal a combater na área.

“Temos que trabalhar na qualidade dos materiais. Não podemos negligenciar essa componente. Temos que aprimorar a questão da fiscalização, para saber melhor distribuir as tarefas. Esqueceram-se da componente corrupção, porque, mesmo que queiramos melhorar os procedimentos, enquanto houver corruptos, eles irão ganhar concursos através de esquemas. Entendemos que a corrupção reduz a questão da qualidade das nossas infra-estruturas”, finalizou o Chefe de Estado.

Os presentes defenderam, ainda, incentivos à investigação e uso das riquezas nacionais para impulsionar a industrialização do país.

Lembre-se que a Ordem dos Engenheiros tem 5 500 membros, entre nacionais e estrangeiros.

 

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