O País – A verdade como notícia

O retrato da COVID-19 no Grande Maputo e sua capacidade de internamento

Há 603 camas para internar pacientes com COVID-19 na região metropolitana do Grande Maputo, das quais mais de 270 já estão ocupadas. O HCM esgotou a sua capacidade, Polana Caniço está a 85 por cento, Mavalane com duas enfermarias preenchidas e Matola 1 conta com nove doentes, sobrando apenas três camas. Eis o retrato do Coronavírus na região metropolitana de Maputo.

Com exclusividade, a equipa de “O País” teve acesso a dois maiores centros de referência no internamento e tratamento de pacientes com COVID-19 da cidade de Maputo e do país. Estamos a falar de Mavalane e Polana Caniço. De outro lado da capital, temos a província com o mesmo nome, Maputo, que conta com dois centros de referência – Matola 1 e Hospital Provincial da Matola.

É sobre esses locais de que os próximos parágrafos se vão ocupar – os centros de internamento na região metropolitana de Maputo. Essencialmente, veremos a sua capacidade de internamento, pois é um dos locais mais afectados pela COVID-19, contando, neste momento, com taxas de positividade que se situam entre 33 e 42 por cento.

À entrada do Hospital Geral da Polana Caniço, pacientes presos à máquina de oxigénio e buscando por respiração chamam a atenção. São pessoas infectadas pela COVID-19 no princípio da agressividade da terceira vaga.

As vítimas desta vaga estão num hospital que guarda as piores recordações da segunda vaga e, logo no início da terceira, já está à beira do colapso, com 85 por cento das 120 camas já ocupadas.

“Estamos a ter uma subida incomum de internamentos. Os números de casos por dia, no país, estão a aumentar. Neste momento, nós temos uma média de 15 pacientes que entram por dia, o que representa uma capacidade de 85% da taxa de ocupação das camas no nosso internamento”, revelou Marino Marengue, director clínico do Hospital Geral da Polana Caniço, alertando que, nos próximos dias, a unidade sanitária poderá atingir a capacidade máxima.

Polana Caniço foi o hospital que tudo viu na segunda vaga e nada se compara a terceira, na qual o Coronavírus escolhe um perfil diferente das vítimas que infecta. Polana Caniço tem cinco crianças internadas.

“Na segunda vaga, só tínhamos mais adultos e idosos, mas, neste momento, todas as idades estão a dar entrada, quer velhos quer jovens. Outra coisa incomum é que, na segunda onda, tínhamos mais pacientes graves com diabetes, hipertensão e com tendência ao estado crítico da doença, mas, nesta terceira vaga, todos os pacientes, não importa se têm ou não comorbidades, tendem a evoluir para o estado grave da doença o que faz com que o internamento seja necessário”, constatou director clínico do Hospital Geral da Polana

A terceira vaga da COVID-19 não só mudou o perfil dos infectados, mas também subiu a média de vítimas mortais por dia. “Neste momento, nós temos a média de dois a três óbitos por dia. É uma situação muito preocupante. Nós ainda não chegamos ao meio da terceira onda, mas estamos a notar número de óbitos igual ou superior ao do meio da segunda vaga. Esta terceira vaga é caracterizada por maior virulência. Os pacientes infectados desenvolvem rapidamente para a gravidade e têm tido um desfecho desfavorável”, indicou Marino Marengue.

O alerta está lançado, o medo presente, mas os heróis da saúde, os que batem de frente com o inimigo de todos nós, estão preparados para mais um combate. “Nós aumentámos a nossa capacidade humana, aumentámos o equipamento, fizemos a manutenção do todo o sistema de oxigénio que era para assegurar o melhor seguimento dos pacientes internados”, avançou o director do Hospital Geral da Polana Caniço.

Para garantir mais espaço de internamento e melhor seguimento dos pacientes infectados, algo tinha de mudar na gestão da pandemia na capital do país. Foi abeto, há quase duas semanas, o Centro de Isolamento de Mavalane com 320 camas que é, actualmente, o maior do país, dando reforço ao da Polana Caniço que era o único de referência na cidade de Maputo.

Durante este período do seu funcionamento, o Centro de isolamento e tratamento do Coronavírus de Mavalane já tem mais de 60 pacientes internados. “Estamos com a lotação das camas quase cheia. Estamos com 80 por cento das nossas camas cheias, pois, em média, nós internamos cerca de 15 pacientes por dia”, revelou Otilinda Camacho, médica responsável pelo Centro de Internamento de Mavalane.

O Centro de Mavalane conta com 13 enfermarias, duas das quais estão lotadas e as outras vão abrindo em função da chegada de pacientes. O perfil dos internados é de adultos e idosos com doenças crónicas associadas que agravam a sua doença.

“Em princípio, nós internamos doentes graves e críticos, pois os pacientes com COVID-19 leve ou moderada não têm necessidade de internamento. Temos mais idosos e adultos com idades compreendidas entre 40 e 80 anos”, explicou Otilinda Camacho.

Um dado curioso é que, no Mavalane, há pacientes internados que receberam, pelo menos, uma dose da vacina e, nalguns casos, as duas. “Para dizer que a vacina por si só, não o único factor protector. As nossas atitudes diante da doença são mais importantes”, apontou a médica responsável pelo Centro de Mavalane.

A agressividade da terceira vaga pode ter ditado a abertura do Centro de Mavalane que tinha sido adiada por muitas vezes.

Com Mavalane, a capital do país eleva a sua capacidade de internamento para 551 pessoas COVID-19. São camas do sector público e privado. “No entanto, nós estamos a preparar os centros de internamento de forma faseada conforme o plano estratégico. Só que, o que estamos a ver agora é que, surpreendentemente, esta terceira vaga está a alastrar-se de forma muito rápida”, recordou Vanda Zitha, médica-chefe da cidade de Maputo.

A continuar assim, dentro de algumas semanas ou mesmo dias, a cidade de Maputo pode não ter mais camas para internar pacientes com COVID-19. Um cenário de caos pode estar à vista. Mas afinal de contas, o que significa uma cama para internamento e tratamento de pessoas com Coronavírus?

“Uma vez que esta doença é de fórum respiratório, nós temos que ter uma cama articulada que permite que o paciente possa estar numa posição confortável para auxiliar a sua saturação de oxigénio. Depois temos que garantir que tenhamos pontos de oxigénio e um monitor que vai controlar os batimentos cardíacos. É a isto que chamamos de cama”, esclareceu a média-chefe da cidade de Maputo.

E por falar em oxigénio, a capital moçambicana tem o recurso em quantidades suficientes e devidamente canalizado para os pacientes internados.

A província e cidade de Maputo estão bem próximos, geograficamente, mas distantes em termos de números de internamentos de pacientes com COVID-19.

A província tem 28 pacientes que lutam pela vida na cama do hospital e destes nove estão no Centro de Internamento da Matola 1, um número reduzido quando comparado com os cerca de 260 da capital.

“A capacidade máxima é de 12 camas. Nós não podemos falar de média, porque ainda estamos a iniciar esta vaga e os doentes estão a entrar gradualmente. Agora temos nove e não sabemos ainda quantos e quando vão entrar os outros”, disse Tânia Almeida, directora do Centro de Internamento Matola 1.

E o internamento pressupõe a existência de uma cama, um conceito muito mais complexo do que se pode imaginar. “Nós temos que perceber que cama não é um leito porque qualquer sítio nós podíamos pôr um paciente. A cama envolve, não só a física, mas ela tem que ter capacidade de oxigénio, ter meios como pessoal, médico, enfermeiro, agentes. É uma máquina toda que se une para cuidar de cada cama. É uma máquina bem oleada para receber os doentes”, esclareceu a directora do Centro de Internamento Matola 1.

Naquele centro, o oxigénio ainda é fornecido em botijas, mas nunca faltou para os pacientes que recebem cuidados médicos no centro da COVID-19 Matola 1.

A província de Maputo tem, no seu todo, 62 camas dos centros de internamento do Hospital Provincial da Matola e Matola 1, sendo que apenas 9 estão ocupadas. “Nós, quando falamos de Matola, cidade de Maputo, estamos a falar de Grande Maputo e a população tem muita mobilidade. Por isso mesmo, é difícil conter a propagação, porque há pessoas que vivem em Boane, mas trabalham na cidade de Maputo e assim sendo, obviamente que elas não saem do serviço (na cidade de Maputo) para vir ao Hospital Provincial da Matola”, expôs Iolanda Tchamo, directora provincial da Saúde de Maputo.

O que significa que parte dos infectados e residentes na província de Maputo estão internados na capital do país e isso, de certa forma, aumenta a pressão. Prevendo-se que a terceira vaga da COVID-19 será mais implacável que a segunda, a província de Maputo garante estar melhor preparada para lidar com esta onda.

Partilhe

RELACIONADAS

+ LIDAS

Siga nos