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“O RAP é intervenção social e intelectual”

Xitiku ni Mbawula conseguiu, depois de vários anos, lançar o seu álbum de estreia lá vão poucos meses. A recepção, não poderia ser a melhor, afinal, as 500 cópias de A kaya, título do disco do grupo constituído por dois membros, esgotou logo na semana a seguir ao lançamento, daí ter-se solicitado o segundo lote para colmatar a procura.  

O sucesso do álbum, de acordo com os integrantes, não vem ao acaso. A kaya está a ser bem recebido porque, explica Dingzwayo, antes de as músicas serem feitas, há uma atenção à forma como as pessoas se comportam e como se relacionam num determinado meio. Depois disso, Xitiku ni Mbawula tenta transcender para uma dimensão imaterial, donde, tendo constatado um problema, avança com a sugestão de uma provável solução. “Essa transcendência é importante porque, como pessoas, fazemos parte dos problemas que constatamos, mas, estando num outro nível, como artistas, conseguimos nos abstrair para olhar a realidade de outra forma”.

E porque fazer música em dupla não é tão simples como fazer individualmente, Dingzwayo explica que daí não surge nenhum problema. O rapper revela que o grupo sempre defendeu que a sociedade moçambicana deve se esmerar em encontrar um ponto óptimo, quando se confronta com conflitos. “A diferença de personalidades também é um conflito, principalmente no que diz respeito à música. SGee vem com ideias que eu rejeito e eu também apareço com ideias que ele recusa. O mais importante é mesmo esse ponto óptimo. Afinal, as diferenças podem nos fazer bem se nós as aceitarmos”.

Em A kaya, Xitiku ni Mbawula aborda o HIV/SIDA, na música “Tlanga upimela”, pois o grupo está convicto de que ainda é necessário. No entanto, mais do que falar da doença ou da prevenção, a dupla entende que é crucial que se fale bem sobre o tema que ainda não está esgotado. “Parece que o nível de ignorância em relação à doença evoluiu para pessoas entendidas. Então, temos que comunicar bem a mensagem sobre o HIV/SIDA. Se conseguirmos veicular a mensagem como deve ser, podemos, inclusive, contribuir para reduzir os níveis de seroprevalência”. E, tendo o texto numa batida de RAP, para o grupo, é uma vantagem porque o ritmo abrange muitos jovens. “Temos, de facto, de moçambicanizar a mensagem à volta do SIDA e esse é o nosso foco, a partir do nosso estilo”.

Na percepção de SGee, depois de tantos anos a enfrentar conotações pejorativas, hoje o RAP está a conquistar mais público, com mais abertura. “Hoje em dia o RAP/ Hip-Hop já é objecto de estudo nas academias. Os próprios fazedores do RAP, estilo de reivindicação, fizeram com que o estilo se incorpore noutros. E isso é bom porque vai ganhando diferentes formas. “O RAP é uma maneira de intervenção social e intelectual”, rematou Dindzwayo. Não querendo ficar calado, SGee sublinhou a seguir: “E o RAP vai continuar a ser um instrumento de luta, reivindicação e educação, tanto que, sendo eu professor, uso o RAP como instrumento didático em alguns momentos da aula, e tenho conseguido resultados positivos do ponto de vista do desempenho académico dos meus alunos”.

No sexto tema deste A kaya, “Afrika”, uma voz sugere para que o continente não aceite que os estrangeiros façam e desfaçam. O grupo entende que a mensagem é oportuna porque África ainda não sabe para onde deve caminhar. “Há um reeditar do passado colonial, quando olhamos para África, neste momento. Estamos numa nova corrida para o continente, com pilhagens de recursos como madeira, enquanto temos escolas em que as crianças aprendem sentadas no chão. Então, temos que repensar na forma de perseguirmos esse nosso objectivo comum de levar o continente avante”, consideram Dindzwayo e SGee.

 

Xitiku ni Mbawula: a missão, o agradecimento e a gratidão

Para Xitiku ni Mbawula, ter microfone na mão representa a responsabilidade de dizer o que os outros gostariam de dizer. “E com o microfone conseguimos fazer com que as pessoas reflictam um pouco sobre as suas vidas e aprendam com o que nós sabemos, afinal Xitiku ni Mbawula não somos apenas nós, mas todos que se identificam com a nossa causa, este fórum de contar estórias com objectivo de dar direcção”.

O CD, constituído por 19 temas, contou com a participação de Isabel Novella, Hawayu, Iveth, Simba, Azagaia e Face Oculta. Estes são os rostos que o grupo acreditou neles para lhes ajudar a fazer o álbum. A kaya tem três cantoras. Nada fortuito. O grupo quis garantir a inclusão da mulher, que é celebrada numa das músicas.

Um dos temas mais conhecidos deste disco é “Samora Machel”, porque, para o grupo, calha sempre bem cantar aquele que ofereceu uma nação aos moçambicanos, uma pessoa com atitude e que trouxe o conceito de unidade nacional ao país.  

A música mais nova do disco é “Khanimambo”, gravada como single, mas inserida em A kaya para agradecer ao apoio recebido.

 

 

 

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