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O exercício de cidadania como dever em Tomás Vieira Mário

Jeremias Langa, jornalista e jurista

Em primeiro lugar, queria dar os parabéns ao Tomás por ter trazido para o formato de livro a contribuição cívica que faz regularmente na STV.  Sim, mais do que comentários, aquilo com que, semanalmente, o Tomás nos delicia nas suas aparições na televisão são aulas de cidadania sobre o nosso comportamento ético quotidiano como sociedade, o nosso comportamento ético perante a rés pública, o crucial papel das instituições como pilar da construção da democracia, o papel dos cidadãos e da cidadania perante o nosso próprio devir.

Sim, com esta obra o Tomás lembra-nos de que, mais do que um mero membro de um Estado ou de uma comunidade política, ser cidadão é uma responsabilidade cívica porque enquanto tal somos detentores de direitos e de deveres perante o Estado e a comunidade de que somos parte.

Este livro teve a sua génese há cerca de 10 anos. Na altura, convidei o TVM para integrar o painel de comentadores do programa Pontos de Vista juntamente com Salomão Moyana. Nos anos subsequentes, o Tomás partilharia o espaço no programa sucessivamente com José Jaime Macuane, Ericino de Salema e Fernando Lima. Foi o período mais profícuo do comentário político na televisão moçambicana e a influência do programa está bem presente no que se faz hoje em muitos canais nacionais de televisão.

Parte do que se discutiu nesses programas Pontos de Vista, e mais recentemente no espaço de comentário que o Tomás passou a ocupar no noticiário da STV às sextas-feiras, está aqui neste livro. Prova inequívoca de que a escrita é imune aos géneros jornalísticos.

O Tomás revela-se sempre nas suas intervenções como um cidadão inconformado com o estado das coisas do seu país, pungente na sua crítica perante o descaso com os mais elementares valores éticos e morais e um intransigente e indefectível defensor do conteúdo jurídico-político de “Estado de Direito Democrático”.

Este é , de certa forma, um livro anti-épico no sentido de que não envereda pela celebração laureada, laudatória, panegírica, apologética das gloriosas realizações governamentais.

É antes um livro que faz uma crítica mordaz, lancinante, pungente da nossa realidade quotidiana.

Mas Tomás Vieira Mário alia, como diria Roland Barthes, a inteligência crítica com a sensualidade verbal.

No lugar do silêncio cúmplice por que envereda a maioria dos moçambicanos perante esta tendência quase auto-fágica perante o bem comum, ou a ominosa realidade da corrupção, da corrosão da máquina do Estado, do enfraquecimento deliberado das instituições, do desprezo pela constituição da República, da apologia do ódio e da desqualificação do outro perante as diferenças, Tomás assumiu o compromisso de intervir no espaço público, escrutinando ferozmente os poderes instituídos.

O seu livro contém cerca de 60 crónicas e está dividido em três grandes capítulos: Ética e sociedade no primeiro; Política no segundo e Comunicação Social no terceiro, mas a temática geral que perpassa por toda a obra está intrinsecamente ligada à construção do nosso devir comum, a ideia de construção de consensos sobre os desígnios comuns e unificadores da nação.

Numa época em que as tentações autoritárias assomam com subtiliza pondo em causa as conquistas democráticas do país, Tomas Vieira Mario clama pelo respeito pelos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos, em particular as liberdade de expressão de opinião e de imprensa bem como o direito dos cidadãos a informação, enquanto conquistas inalienáveis do nosso Estado.

Tomás clama pela criação e ampliação de espaços de debate público no país como alicerces da cultura democrática para que esta  acção dos cidadãos tenha um efeito dissuadir perante o progressivo aniquilamento da eficácia da administração pública e até da segurança estratégica do Estado, como tristemente nos mostrou o julgamento do caso das dívidas ocultas.

Uma proposta de refundação do Estado

Mas ele não se limita a meros clamores: apresenta propostas, a mais marcante das quais a reforma profunda do Estado, a qual, diz ele, deverá culminar com a refundação do Estado moçambicano.

Porque, defende o autor, chega a permitir o acesso e exercício do poder de Estado para a instrumentalização deste Estado para apropriação privada dos recursos da colectividade.

A leitura é o processo cognitivo complexo de decodificar símbolos para extrair significados.

Mas também é um processo de criação de significados. Em cada leitura, o leitor gera a sua própria significação. Espero que cada um de vós faça a sua própria leitura do livro.

Aliás, um texto é um mero artefacto verbal que só se transforma em objecto estético mediante a leitura.

Têm aí estes Comentários na STV. Leiam-no!

*Texto de apresentação do livro “Comentários na STV”, de Tomás Vieira Mário

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