O País – A verdade como notícia

“Investimento português por milhão de dólares é o que mais cria empregos em Moçambique”

O português Eurico Brilhante Dias, secretário de Estado da Internacionalização, conta-nos sobre o desempenho do investimento português em Moçambique. Acompanhe a seguir a entrevista:

Moçambique atravessa, há sensivelmente dois ou três anos, uma crise económica e financeira profunda, com efeito devastador ao nível das empresas quer nacionais, quer estrangeiras. Portugal é um dos maiores investidores em Moçambique. Neste momento, qual é a fotografia que tem das empresas portuguesas estabelecidas em Moçambique?

As empresas portuguesas em Moçambique estão em muitos sectores, mas sofrem, naturalmente, com as consequências, como qualquer outra empresa que esteja na economia moçambicana. Mas as empresas portuguesas mais resilientes, aquelas que, de facto, têm apostado no mercado moçambicano e no desenvolvimento das suas actividades na economia moçambicana, estão para ficar. Aliás, Portugal definiu sempre o mercado moçambicano como prioridade, e o que muitas delas vislumbram é uma economia moçambicana que tem um conjunto vasto de oportunidades, que vai crescer em 2017 provavelmente mais do que em 2016, e que se prevê que 2018 possa ser um ano melhor, e que por isso é um mercado em que devemos continuar a apostar. E a minha vinda à Moçambique é um sinal claro do governo português, de que o mercado moçambicano é um mercado importante para as empresas portuguesas e queremos continuar a colaborar. O investimento português por milhão de dólares é o que mais cria empregos em Moçambique. Por cada milhão de dólares de investimento português, criam-se 36 postos de trabalho, em comparação com 27 postos de trabalho por cada milhão de dólares investido por outros investidores.

É investimento maioritariamente focado às pequenas e Médias Empresas?

Nós temos um portfólio de empresas que querem estar no mercado moçambicano, muito diferente, porque estão grandes empresas no sector financeiro, no sector de papel, no sector da distribuição, onde alguns dos mais importantes players da economia portuguesa estão a entrar de forma comprometida. Mas depois temos um longo leque de PME que investem aqui, ficam aqui, deixam os resultados e lucros aqui para reinvestir, como por exemplo no sector metalo-mecânico, na área da formação técnica, empresas mistas como é o caso do Instituto Superior de Transportes, que tem empresas de capital português e empresas moçambicanas, e isso faz com que a intensidade de mão-de-obra seja muito superior e isso para nós é importante, porque a melhor forma de investir é criando postos de trabalho e gerar riquezas.

Há-de concordar que esta crise afectou maioritariamente as PME, que têm menos capacidade de resiliência, comparativamente aos grandes bancos, indústria da construção civil. Que impactos esta crise está a criar e quais são os mecanismos que existem quer em Moçambique, quer em Portugal, para tentar ajudar estas empresas.

Os números mais recentes que temos sobre empresas portuguesas em Moçambique mostram que no ano 2016 tivemos um ligeiro decréscimo de empresas portuguesas em Moçambique. Mas posso dizer que há mais de duas mil empresas de capital português em Moçambique, distribuídas por vários pontos do país, mas com a distribuição do Produto Interno Bruto, do ponto de vista geográfico, muitas delas no sul do país. São concretamente 2025. Em 2015, chegamos a ter duas mil e duzentas empresas. Há um ligeiro decréscimo, e este ligeiro decréscimo é evidente que é resultado do contexto macro-económico da economia moçambicana, mas são 2025 que estão, e o que eu vejo é o que nós continuamos a dizer que a economia moçambicana é uma economia com muito potencial, pode estar a viver um momento contextual de maior aperto, mas a perspectiva que temos é de que a economia moçambicana vai crescer mais em 2017 do que cresceu em 2016 e vai crescer mais em 2018 do que em 2017. E estes indicadores com a estabilidade cambial e com a perspectiva que temos, os analistas da economia moçambicana vão acentuando esta ideia de estabilidade e que é a nota de confiança que nos é dada pelas autoridades moçambicanas. Nós acreditamos que temos um contexto para aprofundar e para voltar a contribuir para o crescimento da economia moçambicana. Nós não somos nem um investidor, nem um parceiro, nem um país amigo de ocasião, nós temos uma longa trajectória em conjunto. Essa trajectória dá-nos colectivamente ( a Portugal e Moçambique) uma vantagem que é a vantagem inegável de eu estar a falar consigo na nossa língua, portanto, temos um vínculo comum. Os portugueses que querem verdadeiramente apostar no mercado moçambicano e querem criar valor aqui têm de ter capacidade de resiliência.

O investimento de Portugal em Moçambique reduziu, em 2016, em 154 milhões de euros, segundo dados do Banco de Portugal. Como disse, existem em Moçambique 2025 empresas com capital português. Quais são os sectores em que estas empresas estão distribuídas?

Portugal, nos últimos cinco/seis anos, teve uma enormíssima variação do investimento. Tivemos anos de maior investimento, como foi o caso de 2011, em que tivemos disponíveis instrumentos com bastante amplitude para apoiar investimento em Moçambique. Recordo de investimento como aldeia olímpica, que foi, na altura, desenvolvida por uma empresa de construção civil portuguesa. Foi feita a obra da linha concessional entre Portugal-Moçambique. E neste momento estamos com as linhas concessionais e comerciais numa circunstância já ocupada, cativada e em execução. E a circunstância cambial tem impacto nas decisões de investimento das empresas. E há um terceiro aspecto que nunca ninguém fala, mas eu acho muito importante que é, em muitas circunstâncias hoje, nós temos empresas que originalmente eram portuguesas e agora são moçambicanas, estão em Moçambique e já são de capital moçambicano.

Tem a ideia do número de quantas empresas neste momento?

São milhares. Empresas que, sendo de origem portuguesa e de capitais portugueses, evoluíram e hoje não são só empresas de direito moçambicano, mas estas empresas, muitas vezes, no seu investimento de lucros não são registadas como investimento português, mas como empresas moçambicanas. Portanto, há essa dimensão que é difícil avaliar.

Agora, sobre a questão relacionada com a distribuição de sectores, a construção civil e obras públicas, energias, área do papel e exploração florestal, o sector bancário, a metalo-mecânica já a começar a ter unidades muito importantes, uma PME em Maputo, de gente que deixou tudo em Portugal e veio à Moçambique e está a ter belíssimos resultados. Na área da distribuição alimentar e de combustíveis, como é o caso da Petrogal e Galp e pensamos que na área dos serviços, nas tecnologias de informação, na área dos serviços de saúde, na área agrícola mais a norte de Moçambique, são empresas que estão em muitos sectores. E esse cruzamento entre a realidade moçambicana e portuguesa é uma realidade que dá frutos e pode dar mais no futuro.

O investimento português é dominante nos sectores que citou e também na banca que é um dos sectores que se sente claramente o impacto da crise, na medida em que quando as empresas têm dificuldade é logo com a banca que lidam. Qual tem sido o reporte a que tem acesso, em relação à sensibilidade desses sectores devido à crise que o país atravessa?

Os problemas na banca não são exclusivos em Moçambique. Portugal também teve os eventos no sector bancário. A Europa e os Estados Unidos foram, desde 2008, varridos por problemas bancários. O caso moçambicano e um caso relativamente diferente do caso português. Essas entidades bancárias têm hoje rácios de conversão relativamente reduzidos, ou seja, têm muitos mais depósitos do que têm capital em crédito junto da economia, quer em meticais, quer em moeda estrangeira. Estão no mercado, cujo nível de bancarização vai crescendo e vamos ter cada vez mais economia a bancarizar, a utilizar os serviços bancários, mas há uma questão inegável que é a questão cambial e a política do Banco de Moçambique, que é uma política não só legítima como aquela que o Banco de Moçambique entendeu como atinente para resolver o problema que tinha, fez com que aumentasse as taxas de juro de forma muito substantiva e isso não afecta apenas aos moçambicanos, afecta também as empresas portuguesas que se querem financiar no mercado moçambicano. Acima de tudo, parece-me que são instituições que estão preparadas para a próxima fase e o Banco de Moçambique já deu indicações de redução paulatina das taxas e, claramente, no nosso entender, com estabilidade cambial, uma boa preparação para uma fase mais expansionista da economia moçambicana, essa banca estará preparada para ajudar neste período mais expansionista. Ao contrário da banca portuguesa que chegou em 2011 a uma circunstância muito difícil, com rácios de conversão superiores a 100%, onde tinha mais crédito concedido do que depósitos, mas a banca moçambicana chega a este momento numa circunstância quase oposta e com mais depósitos do que crédito concedido, o que mostra alguma solidez, com taxas de incumprimento muito baixas, em comparação com as que conheço do mercado português.

E porque estamos a falar de decisões da autoridade monetária moçambicana, o Banco Central, o mesmo que tomou decisões em relação a um banco moçambicano, mas que tinha um capital importante português, através do BES. Como é que de Portugal, viu esta intervenção do Banco Central moçambicano em relação ao Moza Banco, onde o BES detinha uma participação importante?

BES e agora Novo Banco. Foi uma intervenção que o Banco Central moçambicano entendeu como necessária para a estabilidade do sistema financeiro moçambicano e a nossa leitura é fundamentalmente esta: o Moza Banco era um banco com uma trajectória com diferentes etapas. O Banco Central moçambicano entendeu, num determinado momento, que para a sua estabilidade era importante fazer uma operação e hoje o banco é detido por uma entidade moçambicana e os outros accionistas reduziram sua participação. Eu penso que, acima de tudo, é importante tornar o Moza Banco num banco útil para a economia moçambicana e nisto estamos em perfeita sintonia e alinhamento com as instituições moçambicanas.

O BES, agora Novo Banco, passou para as mãos do Estado português. Existe alguma perspectiva para Moçambique? Acompanhamos no processo actual, que o Novo Banco não estava disponível para o novo processo de recapitalização do Moza Banco. Existe alguma perspectiva para as participações que o Novo Banco detinha?

A questão do Novo Banco está em Portugal em processo de conclusão. Foi apresentada uma solução, que inclusive já foi discutida no parlamento português. É uma matéria que é seguida pelo Ministério das Finanças em Portugal e não pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros ou pelo secretário do Estado da Internacionalização. A operação está em fase de closing.

Existe uma autonomia ao nível do Banco Central em termos de decisões que devem ser tomadas.

É porque o fundo de resolução, que é o accionista do Novo Banco, é uma entidade sob administração do Banco de Portugal.

Partilhe

RELACIONADAS

+ LIDAS

Siga nos