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Instituições públicas melhoraram na disponibilização de informação de interesse público

Hoje é Dia Internacional do Acesso à Informação. A este respeito, o Instituto da Comunicação Social da África Austral em Moçambique (MISA-Moçambique) lançou esta segunda-feira dois estudos nos quais conclui que há “uma ligeira evolução das instituições públicas [comparativamente a 2018] no processo da disponibilização da informação do interesse público, em resposta aos pedidos de informação” pelos cidadãos.

A ministra da Administração Estatal e Função Pública, Ana Comoana, garantiu que o Governo vai, sempre, promover acções de modo que “o acesso à informação seja assumido e compreendido por todos como uma forma de participação individual e colectiva nos processos de implementação da agenda comum, que é o desenvolvimento e o bem-estar social de todos”.

Segundo a governante, “falar do acesso universal à informação” é também fazer “referência ao papel do jornalista em Moçambique, que deve ser celebrado permanentemente destacado”.

Para Ana Comoana, o jornalista está em todas as frentes para dar a conhecer ao país e mundo o dia-a-dia dos moçambicanos em diferentes áreas.

Eduardo Constantino, secretário-geral do Sindicato Nacional dos Jornalistas (SNJ), disse que “o acesso à informação continua a ser um enorme desafio” para todos no país.

“Depois de todo o tempo que se levou para a aprovação deste direito pela Assembleia da República, a sua materialização continua longe de ser uma realidade” porque “os que são detentores de informações públicas e para o público continuam a arranjar vários subterfúgios para não as facultarem”.

Esses subterfúgios vão desde o alegado “segredo de justiça até à falta de autorização pelas estruturas superiores”, de acordo com Eduardo Constantino, que mesmo assim reconhece haver evolução nesta matéria.

O secretário-geral do SNJ lamentou ainda o facto de, apesar de seguirem os passos determinados pela lei, os cidadãos, incluído os jornalistas, ainda enfrentam obstáculos no acesso à informação. A situação condiciona o trabalho dos profissionais da comunicação social, por exemplo.

Aproveitando a celebração do Dia Internacional do Acesso à Informação, Eduardo Constantino apelou às autoridades a respeitarem a legislação atinente a esta matéria. Lembrou ainda que o não cumprimento constitui uma violação da Constituição da República e de demais leis.

Em representação do MISA-Moçambique, Fátima Mimbire considerou o acesso à informação vital em democracia, pois não só garante a transparência dos processos de gestão de bens públicos, “como também é um instrumento de participação política dos cidadãos na governação”.

Neste contexto, “é imprescindível que a administração pública se esmere na publicação sistemática de informação de interesse público, tendo como base o princípio de proactividade conforme determina a própria Lei do Direito à Informação”.

O ESTUDO DO MISA-MOÇAMBIQUE

Nos dois estudos hoje divulgados, são avaliados a abertura das instituições para o acesso à informação de interesse público este ano e os níveis de pedidos de acesso à informação feitos pelos cidadãos entre 2017 e 2020, bem como as respectivas respostas dadas pelas instituições aos peticionários.

Foram submetidas à referida avaliação 10 instituições, nomeadamente o Conselho Municipal da Cidade da Matola, Ministério das Obras Públicas, Habitação e Recursos Hídricos, Ministério da Agricultura e Desenvolvimento Rural, Instituto Nacional dos Transportes Terrestres, Fundo Nacional de Investigação, Ministério dos Recursos Minerais e Energia, Instituto de Gestão das Participações do Estado, Ministério da Economia e Finanças, a Secretaria de Estado da Juventude e Emprego e o Ministério da Saúde.

Embora as instituições ainda não disponham de salas de consultas e de pessoa específica para receber e dar resposta aos pedidos, “notámos que grande parte das instituições possui bibliotecas e gabinetes de comunicação e imagem que podem servir de locais de disponibilização de informação”.

Persiste a ausência, na lei, de mecanismos claros e menos burocratizados de responsabilização dos funcionários que não respondam os pedidos ou não disponibilizem a informação solicitada, o que incentiva o silêncio como resposta aos pedidos de informação dos cidadãos. As bibliotecas visitadas apenas contêm informação interna das instituições publicada em boletins internos. A restante informação é bastante antiga, conclui também a pesquisa a que nos referimos.

“Embora as instituições avaliadas continuem sem registar grande evolução no que respeita à sua estruturação para atender aos pedidos de informação – continuam sem salas de consultas nem pessoal com formação para atender especificamente os pedidos de informação dos cidadãos –, notámos uma evolução considerável na disponibilização da informação através de websites”, refere o documento a que “O País” teve acesso.

Os websites das instituições apresentam cada vez mais informação relevante, mas persiste a tendência de não disponibilizar informação relacionada com os relatórios das auditorias financeiras, contratos públicos, actas de adjudicações de concursos públicos, processos muitas vezes objecto de contestação devido a falta de transparência.

CATEGORIAS AVALIADAS

A avaliação obedeceu duas categorias: a primeira consistiu na avaliação de sites do Governo e de instituições públicas para determinar o grau de acessibilidade e existência de informação fiável e actualizada detida por organismos públicos, que “inclui competências e funções da instituição, dotações orçamentais, procedimentos de adjudicação de concursos e informação de contacto”.

Durante 21 dias, foram analisadas páginas web e de redes sociais das instituições seleccionadas. Das análises efectuadas e complementadas por envio de mensagens para pedido de informação, constatou-se que há uma tendência crescente de exploração das páginas web e redes sociais para interacção com o cidadão.

Ademais, “muitas instituições, sobretudo as que são avaliadas desde as edições anteriores do estudo, melhoraram na colocação de informação de utilidade pública nas suas páginas web e predomina muito a informação noticiosa e infográfica em lugar de documentos relevantes para partilha com o público”.

Contudo, “apesar de assinaláveis avanços, continuam algumas limitações quanto à gestão das páginas web, que se pode citar algumas: ausência de uma assistência contínua e estratégia de exploração das páginas web, falta de um calendário de gestão e manutenção das páginas, em alguns casos as páginas dependem da vontade de algum funcionário voluntário para colocação de informação”.
Constatou-se ainda dificuldade de cobrir os custos de exploração e de hospedagem de web. Em quase todas instituições foi notória a dificuldade de interagir por vias virtuais, diz o estudo.

A segunda categoria diz respeito aos pedidos de informação apresentados a instituições governamentais e públicas para determinar o grau de facilidade de obtenção de informação pública junto destas mesmas instituições.

A propósito, “continua a não existir uma estrutura específica responsável pela recepção, direccionamento, processamento e resposta de pedidos de informação dentro das instituições públicas e estatais, o que dificulta aos recepcionistas a identificação do departamento detentora de informação solicitada para o qual o pedido deve ser encaminhado”.

De acordo com o MISA-Moçambique, devido à essa dificuldade, os pedidos acabam por circular de departamento em departamento. Em todas as instituições, os pedidos são depositados na recepção, secretaria-geral ou nos departamentos de comunicação e imagem das entidades avaliadas.

Prevalece, em muitas instituições, o excesso de centralização da informação na figura de liderança superior da instituição (ministro, vice-ministro ou director), fazendo com que os pedidos levem mais tempo em circulação (…).

“Ou seja, primeiro envia-se o pedido de informação recebida para o chefe do sector, este para o director, o director, por seu turno, para o vice-ministro e, finalmente, para o ministro. O ministro baixa o pedido para o director do sector e este para o chefe do departamento até aos técnicos que irão processar a informação. Concluído o processamento de informação, segue-se a mesma hierarquia até ao ministro antes de ser enviada para o cidadão que a solicitou. Este processo leva mais de 21 dias”, Segundo o MISA-Moçambique.

Em algumas instituições, a autorização do Presidente do Conselho de Administração (PCA) não é suficiente para a disponibilização de informação, sendo necessária outra autorização do director do pelouro detentor da informação.

Isto significa, de acordo com o estudo, que “mesmo havendo ordem de disponibilização da informação pelo superior hierárquico máximo”, a mesma “pode demorar a ser emanada quando as lideranças intermédias não estão em concordância.

Entretanto, “notámos com agrado que todas as instituições que responderam os pedidos tiveram o cuidado de o fazer dentro do prazo fixado pela lei”, diz o autor da pesquisa.

RECOMENDAÇÕES

O MISA-Moçambique recomenda, em parte, que os funcionários públicos sejam submetidos à formação em matéria da Lei do Direito à Informação. O processo deve igualmente abranger os detentores de cargos públicos, os principais detentores e gestores de informação relevante como contratos, actas de adjudicações de serviços, relatórios e contas.

O estudo sugere ainda capacitação de gestores públicos e de chefes de gabinetes jurídicos das empresas públicas de modo a terem domínio sobre a Lei do Direito à Informação e “continuação da capacitação de funcionários sobre gestão de websites, assim como sobre a priorização da informação de interesse público para a actualização nos websites, mais do que o depósito de notícias institucionais”.

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