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Há “Volúpia da pedra” na cidade da Beira

Adelino Timóteo vai lançar mais um livro. Intitulado A volúpia da pedra, a colectânea de poesia será apresentada ao público às 18h desta segunda-feira, no Centro Cultural Português, Pólo – Beira.

Na nova odisseia literária, o poeta quis exprimir o que considera relação biunívoca entre o sujeito poético e o objecto da sua escrita, a pedra. Esta relação é ao mesmo tempo dual, porque decorre da intimidade entre o sujeito-poético e a pessoa amada, personificada na pedra, transfigurada, também, na poesia. “No fundo, pretendi evocar uma nova inquietação dentro da minha poesia, de cunho afectiva, mas procurando salvar o que parecia gasto, inovar-me. É assim: onde antes o sujeito-poético amava uma mulher, neste livro ele fá-lo a uma pedra”.

Na verdade, neste A volúpia da pedra há muito jogo metafórico a envolver a imagem da mulher e da pedra. Sobre esta ocorrência, Timóteo explica que tal deve-se a uma catarse dentro do seu enunciado poético, afinal a escrita do livro decorre dentro de ilusões e alucinações, pois por vezes o sujeito-poético está dividido entre a pedra e a mulher, que no fundo se fundem num discurso único.

Embora o livro seja curto, possui apenas 39 páginas, o poeta investiu, como lhe é característico, num texto profundo e prolongado, porque, segundo o autor, os poetas são seres inconformados. Assim, “um poema é a reescrita do anterior, um encadeamento de várias circunstâncias e situações, na minha poesia em prosa. Daí há a persistência nas alusões e na recuperação do enunciado. Se quiser, a poesia que é, senão o eco, a repetição das ressonâncias físicas e sonoras, de há milhares de anos. Dizer a pedra, dizer a mulher, é inceptar a fuga para um tempo arcaico, remoto”. Referindo-se ainda ao novo livro, Adelino esclarece: “No fundo eu pretendia dialogar com as vozes que fundaram os textos da antiguidade, sendo a pedra um objecto primigénio, milenar, tão velho como o mundo, tão velho e novo como a própria poesia, sendo ela o rosto visível e invisível de uma mulher que pretendi esconder por detrás da pedra e da palavra, por detrás da poesia, tornando-a mítica, misteriosa, aliás, como o é a escrita própria, a própria poesia”.

Adelino Timóteo assume que tem uma relação afectiva muita antiga com a pedra. “Recordo-me, em miúdo, eu via uma pedra gira, lapidada, escultural e a recolhia ao bolso. Passaram-me muitas afectividades entre mim e ela. Mas essa afectividade precipitava e estrangulava-se sempre que um empregado em casa tomava os meus calções e os punha no lava-roupa. Vejo nisto tudo um jogo, um encanto, uma busca de leveza, mesmo sabendo que a pedra é opaca, rija e obtusa. Vejo em tudo isso, nesta afectividade, a transfiguração do humanismo, da paz, porque a pedra, domesticada, sabe ser quieta, sabe se comportar como se fora a pessoa ideal, a servir-nos, a cumprir ou dispor-se, nos meus caprichos. E isto porque não conheço poeta que não seja caprichoso, no bom sentido de pretender domesticar a ambiência ao redor”.

A volúpia da pedra foi escrito e reescrito mais ou menos 15 vezes. Adelino burilou-o até à exaustão. “Enquanto não me fartei de escrever e rescrever este livro nunca o dei por pronto. E para mim esse diálogo inscreve-se no afecto, numa relação de cumplicidade, graças a visões que recebia ao longo da escrita. Eu preferia dizer um diálogo de enamoramento entre o poeta, a pedra e a poesia. É em síntese o que pretendi que fosse A volúpia da pedra.

Nesta aventura literária, Adelino Timóteo reconhece por via da poesia o que move o homem: a dimensão física e metafísica, a sede de amar, a sede de partir ao desconhecido e chegar, a aventura. A dimensão do amor, a dimensão de afectividade.

“Este livro é também a chegada a Ítaca, com os meus mitos, os meus desejos e sonhos, depois de exorcismar os fantasmas, depois de limpar o lixo que nos envolve, faço uma longa travessia. Movo-me na direcção do essencial: a mulher”.

Adelino Timóteo espera que os seus leitores encontrem, nesta aventura, não a cisão do poeta com a poesia intimista, mas com a forma com que vai dizer e escrever a poesia.
 

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