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BM baixa taxas de juro e critica reacção tímida da banca comercial

É a terceira vez que o Comité de Política Monetária (CPMO) do Banco de Moçambique reúne este ano e, como sempre, os encontros terminam com boas e más notícias. Comecemos pelas boas: o CPMO baixou a taxa de juro de política monetária (taxa MIMO) para 15,75 por cento – uma redução em 75 pontos base.

A taxa da Facilidade Permanente de Cedência de Liquidez (FPC) – que é o mesmo que taxa de juro cobrada pelo Banco Central aos bancos comerciais pelos créditos que estes podem obter naquela instituição – manteve-se em 18 por cento. Já a taxa da Facilidade Permanente de Depósitos – taxa de juro paga pelo Banco Central à banca comercial pelos depósitos que esta pode efectuar junto do regulador – baixou 50 pontos base, fixando-se em 12 por cento.

A estabilidade da inflação e a sua projecção a médio prazo, que continua a apontar para um dígito, permitem ao Banco de Moçambique prosseguir com a redução das taxas de juro de referência. Em condições normais, a queda da taxa MIMO devia ser acompanhada pela redução das taxas de juro que os bancos comerciais cobram aos seus clientes. Mas isso não está a acontecer, o que é má notícia. O Banco Central fala de uma “redução tímida” das taxas de juro a retalho: por exemplo, a taxa média de juro aplicada pela banca comercial sobre os empréstimos com prazo de um ano baixou de 31.89, em Dezembro de 2017, para 28.69 por cento em Abril. Já a prime rate – a taxa de referência do sistema financeiro moçambicano para as operações de crédito em meticais – baixou de 27.25, em Dezembro do ano passado, para 22.50 por cento em Junho.

Na conjuntura actual, estas taxas de juro continuam relativamente elevadas, reconheceu o governador do Banco Central. Ainda assim, Rogério Zandamela pede paciência. Paciência porque o Banco Central não pode recorrer a medidas administrativas para obrigar os bancos comerciais a reduzirem as taxas de juro ao mesmo ritmo da queda das taxas de referência; paciência porque algumas medidas levam o seu tempo para produzir resultados. “Uma componente das taxas de juro tem a ver com o comportamento das taxas de referência e da política monetária, mas outra tem que ver com o mercado. A nossa esperança é que as taxas de juro continuem a cair”, disse, admitindo que a intensidade podia ser outra. E não é porque nem tudo depende do Banco de Moçambique. “Depende de outros factores fora do nosso controlo, como o exercício das reformas, o comportamento das finanças públicas e a consolidação da política fiscal”.

Em contrapartida, a taxa de juro que a banca comercial paga pelos depósitos a prazo (um ano) dos seus clientes continua em queda livre. Por exemplo, de Dezembro de 2017 a Abril, esta taxa caiu de 19.96 para 13.85 por cento. A diferença entre a taxa de juro sobre os empréstimos e a taxa de remuneração de depósitos a prazo é 14.84 por cento. Conclusão: os bancos comerciais cobram duas vezes mais pelos empréstimos do que pagam pelos depósitos a prazo dos seus clientes.

Custos foram decisivos para demissão da Comissão Liquidatária do Nosso Banco

“Vou ser franco e aberto: estas coisas são complicadas, porque têm custos”. foi assim como o governador do Banco de Moçambique reagiu à pergunta colocada pelo jornal O País sobre as razões da demissão da Comissão Liquidatária do Nosso Banco, presidida pela Deloitte & Touche (Moçambique). E os custos têm que ver com os pagamentos a esta comissão. A explicação parece simples: “Quanto mais gente a trabalhar neste assunto, maior são os custos e menor será o dinheiro disponível para restituir aos credores e depositantes do extinto banco. É nossa obrigação proteger esta gente”.

O governador garantiu que o processo de liquidação não parou e continua a ser dirigido pelo Banco Central. Sobre as sanções aplicadas aos antigos gestores do Moza Banco, Zandamela disse que as mesmas fazem parte da disciplina de mercado. “Quando há desvios, o regulador tem de tomar as medidas necessárias para corrigir e até para mandar mensagem aos outros gestores. Não há economia de mercado sem sanções. Senão, o mercado vira anarquia”.

Défice nas contas públicas aumenta endividamento interno do Estado para mais 12 por cento do PIB

Enquanto o crédito ao sector privado continua estagnado – em parte devido às altas taxas de juro na banca comercial, o endividamento público está em alta. Devido ao agravamento do défice nas contas públicas, o governo recorreu ao mercado interno para se financiar. E as contas do Banco de Moçambique indicam no primeiro trimestre do ano, o governo contraiu uma dívida no valor de 4.343 milhões de meticais. Este valor correspondeu a 46 por cento do défice público, sendo que a outra parte foi coberta através de fundos de ajuda externa destinados a projectos de investimentos. “Contribuiu para o agravamento do défice público, o pagamento do serviço da dívida pública que atingiu 8.489 milhões de meticais”, quase o dobro do valor pago no primeiro trimestre de 2017.

Até ao último dia de Maio, a dívida interna do Estado na forma de Bilhetes de Tesouro (BT), Obrigações de Tesouro (OT) e adiantamentos do Banco de Moçambique totalizava 105, 5 mil milhões de meticais, equivalente a pouco mais de 12 por cento do Produto Interno Bruto (PIB). Os BT e OT constituem títulos de dívida pública a curto e médio prazos, emitidos pelo Tesouro para financiar o Estado. Rogério Zandamela fez notar que existem outras dívidas do Estado que o Banco de Moçambique ainda não apurou, designadamente aquelas que têm que ver com contratos mútuos, contratos de locação financeira (leasing) e responsabilidades em mora, que é o que o Estado paga pelo atraso no reembolso de um título de crédito em um determinado período de tempo.

Quanto às taxas de câmbio, os números do Banco Central indicam que o Metical continua a registar ganhos face às principais moedas no mercado cambial doméstico. Comecemos pelo Dólar norte-americano: depois de ter registado uma cotação média de 60,98 meticais/dólar no dia 10 de Abril, a taxa média praticada pelos bancos comerciais junto ao público situou-se em 59,38 meticais no fecho do dia de 15 de Junho. No mesmo período, a cotação do Rand sul-africano passou 5,05 para 4,49 meticais.

O comportamento do Metical reflecte, em parte, o aumento da liquidez em moeda externa no segundo trimestre, situação que permitiu ao Banco de Moçambique realizar compras líquidas de divisas junto ao sistema bancário. Como resultado, as reservas internacionais aumentaram para 3.235 milhões de dólares, valor suficiente para cobrir cerca de sete meses de importação de bens e serviços, excluindo, claro, as transacções dos grandes projectos.

Preços altos de combustíveis e transportes subiram a inflação

Informação referente a Maio indica que a inflação permanece baixa e estável, ao fixar-se em 3,26 por cento, após 2,33 por cento em Abril. É importante aqui lembrar que em Maio do ano passado, a inflação atingiu 20,45 por cento.

A subida da inflação registada em Maio deste ano é justificado pela subida dos preços de serviços e bens administrados (transportes, combustíveis, água, energia). Por exemplo, os combustíveis líquidos sofreram um aumento de quase 19.29 por cento, que acrescido à subida dos preços de transporte de passageiros determinou uma variação positiva da inflação de 0,53 por cento. “Excluindo os preços dos produtos e serviços administrados, a inflação anual fixou-se 1,03 por cento. Do ponto de vista da política monetária, esta é a inflação mais relevante, pois temos que excluir os factores sazonais ou políticos – porque os preços administrados é uma decisão política”, explicou Rogério Zandamela.

Como desafios internos, o Banco de Moçambique aponta para as incertezas quanto ao rigor das medidas de consolidação fiscal necessárias para mitigar o risco associado à sustentabilidade da dívida pública no contexto do ciclo eleitoral de 2018 e 2019.

 

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