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As faces de uma cidade em ‘Vagando Maputo’

Todas as cidades têm uma face escondida,

uma face que passa despercebida à maioria dos seus habitantes

Eduardo Paixão

 

Uma das maiores faces escondidas de Maputo é a Rua de Bagamoyo, para os mais velhos, Rua Araújo. E Eduardo Paixão é claro, quando, num dos seus belíssimos romances, Cacimbo, faz a descrição do que ali até hoje acontece. Contudo, as faces escondidas encontradas na exposição fotográfica Vagando Maputo, da francesa Aurore Vinot, são outras, feitas de gentes e de espaços por elas frequentados.

No total, são 20 fotografias que Vinot expõe no Centro Cultural Franco-Moçambicano, em Maputo, das quais em 15 também apresentam-se perfilados artistas como Manuela Soeiro, Mário Macilau, Gonçalo Mabunda ou Filipe Branquinho. A partir desses retratos, os apreciadores da exposição são convidados a tentar adivinhar as emoções das figuras ali existentes no momento em que o clique da máquina disparou. Não obstante, as fotografias foram concebidas de tal forma que, mais do que as faces dos homens fotografados, pudessem apresentar outras, atinentes aos lugares reais ou inventados por um determinado jogo de luz (natural ou artificial). Por isso, escapa sempre a sensação de se tentar adivinhar em que parte da cidade as pessoas deixaram-se fotografar.

Parece que Vinot, neste Vagando Maputo, deixou-se levar por pelo menos duas escolhas: deixar a imaginação fluir com imagens capturadas ao lusco-fusco e colocar na mente dos visitantes da exposição os nomes dos fazedores de arte. Deve ser esta a razão de ter privilegiado a ideia de narrar histórias sobre a capital do país através dos silêncios aparentemente enigmáticos de Mia Couto, The Mute Band ou Ana Raquel Machava, com os olhos fechados, a provocar muitas inquietudes, interrogações na paz interior em que se encontra quem a contempla, tão só quanto abundante. Acabamos ficando cativos àquela solidão feita de África. 

Cinco das fotografias que constituem Vagando Maputo reflectem a imagem de uma cidade decadente, sem esplendor, carente de intervenção humana para que os prédios voltem a fazer parte do belo que se esconde por detrás dos cenários desbotados. A fotografia “Vila Algarve” ou “Teoria do Groove” são dois exemplos das infra-estruturas esquecidas, condenadas aos impulsos da memória.

Esta exposição de Aurore Vinot é um fragmento muito pequenino do que Maputo é. Tirando as fotos feitas às pessoas, as imagens das construções capturadas na zona cimento aparentam terem sido feitas ocasionalmente, sem grande premeditação. Não se trata, portanto, de uma grande exposição fotográfica, susceptível de causar alguma impressão nos apreciadores. Muito longe disso. Esta é uma proposta que revela como a autora francesa viu Maputo quando cá esteve, sem fotografias encantadoras, aliás, algumas até têm resolução fraquinha para as dimensões em causa. Bem dito, Vagando Maputo poderia ter sido uma exposição mais profunda, por exemplo, seguindo o trajecto das infra-estruturas ou dos rostos. Assim sendo, é apenas mais uma obra exposta no Franco-Moçambicano. Ao menos as paredes ficam coloridas.

Título: Vagando Maputo

Autora: Aurore Vinot

Exposição fotográfica

Classificação: 10,5

 

 

 

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