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António Alves da Fonseca, o organizador técnico das reportagens da independência

No dia em que se proclamou a independência nacional, António Alves da Fonseca foi o organizador técnico de todas as reportagens feitas pela Rádio de Moçambique. Fonseca fez radio durante 50 anos e acompanhou alguns momentos-chave da História de Moçambique.

António Alves da Fonseca nasceu a 15 de Agosto de 1929. Aos 25 anos de idade, em 1954, entrou para Rádio Clube de Moçambique, onde teve imensas oportunidades de testemunhar momentos importantes da História do país.

20 anos depois de ser admitido à Rádio Clube de Moçambique, em 1974, Alves da Fonseca teve a responsabilidade técnica de garantir a cobertura da Assinatura dos Acordos de Lusaka. Mas, nessa altura complexa, que marca uma transição do período colonial para a independência de Moçambique, a sua missão não foi nada fácil. Afinal, alguns portugueses residentes na capital moçambicana recusaram-se a aceitar a independência nacional. E, por isso, tomaram a Rádio Clube de Moçambique, omitindo informações sobre o que se passava na Zâmbia.

48 anos depois de Setembro de 1974, António Alves da Fonseca lembra-se de tudo como ontem, pois os eventos ocorridos na capital moçambicana boicotaram a missão que tinha: “Isso trouxe para mim graves problemas, porque era necessário transmitir para Lourenço Marques, na altura, o que se estava a passar em Lusaka. Mas a central técnica da Rádio foi tomada pelos correligionários e acabei por não poder fazer a transmissão total dos Acordos de Lusaka”.

O episódio a que Fonseca se refere deu-se na primeira semana de Setembro de 1974. Quando parecia que a violência resultante dos 10 anos de luta armada de libertação nacional tinha chegado ao fim, a tomada da Rádio Clube quase gerou um caos social, fazendo que moçambicanos residentes nos subúrbios de Lourenço Marques, nos distritos à volta e em Gaza marchassem com catanas para fazer justiça com as próprias mãos. Aurélio Le Bon, um dos heróis da operação Galo galo amanheceu, que consistiu em recuperar a emissora, retratou a situação no livro Mafalala 1974 – memórias do 7 de Setembro, a grande operação: “Assaltei a Rádio Clube de Moçambique em duas fases estrategicamente concebidas para assegurar o lançamento da senha que daria à população sinal de que estaria em processo a retoma da emissora pela direcção da nossa base na Mafalala. (…) Quando cheguei aos microfones da Rádio, na primeira fase da operação, lancei a senha Galo, Galo, Amanheceu, com o suporte de duas Companhias de Paraquedistas do Exército Português, sob o meu comando. Coordenei o plano de restabelecimento da normalidade da Rádio, e li pela primeira vez os Acordos de Lusaka”.

Quando os moçambicanos tomaram o controlo da Rádio Clube de Moçambique, a paz foi restabelecida e o órgão cumpriu a grande função de fazer chegar às pessoas os eventos sobre a tão aguardada independência nacional. António Alves da Fonseca, uma vez mais, fez parte desse passado histórico: “A Rádio teve uma forte presença [na promoção da independência] porque, além do Notícias e do Diário de Moçambique, era o único meio de transmissão [de informação]”.

Na cerimónia da proclamação da independência nacional, António Alves da Fonseca não esteve no Estádio da Machava, pois, a partir da Rádio, teve a missão de desempenhar uma outra função gigantesca, a de garantir que a proclamação da independência fosse escutada por milhões de moçambicanos e amigos de Moçambique. “Fui o organizador técnico de todas as reportagens que fizemos durante o dia em que se proclamou a nossa independência”, o que não foi feito de um dia para o outro. “Tudo foi tratado com antecedência, com os pontos de referência dos repórteres em sítios onde ficariam em vários pontos da cidade, depois de proclamada a independência”.

Depois de se dedicar 50 anos (dos 92 de idade que tem) ao serviço de rádio, António Alves da Fonseca lembra-se com satisfação desse passado emblemático da História de Moçambique que testemunhou com um papel preponderante.

 

 

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