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Agenda 2030 em risco de falhar na educação e saúde

 "O mundo “não está bem encaminhado para erradicar as privações extremas na saúde e na educação” até 2030, no âmbito dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável. Até lá, o provável é que 225 milhões de crianças não tenham acesso à escola. Outros três milhões, com menos de cinco anos, morram anualmente, devido a desigualdades no desenvolvimento humano. A situação resulta, em parte, da ausência do “poder colectivo das pessoas” e de força para “exigir mudança” nos problemas que enfermam a maioria.

“O mundo será um lugar melhor em 2030”, se os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável forem alcançados, mas, apesar do progresso, no mundo, muita gente tem “poucas perspectivas para um futuro melhor”, devido a desigualdades em diferentes áreas.

O grosso da população perdeu a “esperança, o sentido de vida ou a dignidade”, porque vê “outros avançar para uma prosperidade sempre maior”, diz um relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).

O documento intitulado “Desigualdades no desenvolvimento humano no século XXI” foi tornado público em Dezembro passado. Destaca que as evidências das desigualdades no mundo são mais profundas e estão em todo o lado. As pessoas “de todas as convicções políticas acreditam cada vez mais que a desigualdade (…) no seu país deve ser reduzida”.

Para se ter ideia do quão as desigualdades acabam com a utopia de um futuro melhor, prometido por aqueles que o povo coloca no poder para o governar, o estudo das Nações Unidas apela para o seguinte exemplo: considere-se duas crianças nascidas no ano 2000, sendo uma num país com muito elevado desenvolvimento humano e outra num país com baixo desenvolvimento humano. Hoje, a primeira criança tem uma probabilidade superior a 50 por cento de se inscrever no ensino superior, um privilégio que, tal como água, escapa entre os dedos para a segunda criança.

“Mais de metade das pessoas com 20 anos de idade em países com um desenvolvimento humano muito elevado estão no ensino superior”, refere a pesquisa, sublinhando que, em contraste, nos países com baixo desenvolvimento, uma criança “tem muito menor hipótese de estar viva”. Se sobreviver, provavelmente não ingressa no ensino superior.

Apenas cerca de 42 por cento de adultos nos países com baixo desenvolvimento humano têm educação primária, contra 94 por cento nos países com desenvolvimento humano muito elevado.

Segundo o relatório em alusão, as diferenças estão em todos os níveis de escolaridade. Se alguém tem dúvidas, a prova disso é que “apenas 3,2 por cento dos adultos nos países com baixo desenvolvimento humano têm educação superior, comparados com 29 por cento nos países desenvolvidos. Cerca de 262 milhões de crianças não frequentam a escola primária ou secundária”.

Na saúde, as Nações Unidas estimam que 5,4 milhões de crianças não sobrevivem nos primeiros cinco anos de vida. E, pese embora haja “um grande acesso a imunizações e a tratamentos acessíveis, as taxas de mortalidade infantil nas famílias, em países mais pobres, mantêm-se elevadas”.

A pesquisa sublinha que “nada é inevitável” dos problemas que elenca, apelando aos países a arregaçarem as mangas, já, com vista a mudar a situação.

As desigualdades “ferem as sociedades, enfraquecem a coesão social e a confiança das pessoas no governo, nas instituições e entre si”, na medida em que “o progresso passa ao lado dos mais vulneráveis”, indicam as Nações Unidas no relatório que consideram não ser mais um documento, mas um guião para os decisores políticos e especialistas que queiram denunciar e suplantar o “poder dos poucos” e instituir o “poder de muitos”, porque só “poder colectivo das pessoas” tem força para “exigir mudança” nos problemas que enfermam a maioria.

Ademais, os rendimentos e as circunstâncias dos progenitores afectam a saúde, a educação e o rendimento dos seus filhos. Por isso, as crianças nascidas em famílias com baixos rendimentos são mais susceptíveis de ter pouca saúde e baixa educação, de acordo com a pesquisa do PNUD.

“Aquelas (crianças) com mais baixa educação têm menor probabilidade de ganhar tanto quanto as outras, enquanto crianças com pior saúde têm mais probabilidade de faltar à escola”.

Este ciclo pode ser difícil de quebrar, sobretudo devido às formas como as desigualdades no rendimento e no poder político se desenvolvem conjuntamente. Mas é preciso agir no sentido de inverter o cenário, porque “quando as pessoas ricas modelam as políticas que as favorecem e às suas crianças – como muitas vezes acontece – isso pode manter a acumulação de rendimento e de oportunidade no topo”.

O relatório chama atenção para o facto de quando o sistema, em geral, é considerado “injusto, provavelmente devido a exclusões sistemáticas ou clientelismo (a troca de favores políticos para ganhos pessoais), as pessoas tendem a afastar-se dos processos políticos, ampliando a influência das elites”.

 

Moçambique com mais crianças fora da escola

O último Recenseamento Geral da População e Habitação indica que a percentagem de crianças de seis e sete anos sem acesso à escola aumentou, entre 2007 e 2017.

Todavia, garantir que crianças de ambos os sexos “completem o ensino primário e secundário, equitativo e de qualidade”, segundo reza a Agenda 2030, até aqui parece uma utopia.

Em 2017, pelo menos 73 e 65,6 por cento de petizes de seis anos e sete anos, respectivamente, não estudavam, contra 63,6 e 41,5 por cento de crianças das mesmas idades nos 10 anos anteriores. Entretanto, há cada vez mais crianças de seis a 17 anos a estudar.

No ensino superior, de 2007 a 2017, a percentagem da população masculina com curso superior baixou de 70,6 para 60,9 por cento. O contrário aconteceu com as mulheres, tendo a percentagem incrementado de 29,4 para 39,1 por cento, no período em referência.

O número de licenciados passou de 58,9 para 82,2 por cento. Todavia, houve redução na formação de mestres, de 11,9 para 7,9 por cento. A população com o nível de doutoramento também diminuiu, de 5,9 para 1,8 por cento.  

Até 2030, o mundo é desafiado, por exemplo, a “reduzir a taxa de mortalidade materna global para menos de 70 mortes por 100 mil nascidos vivos”.

Mas, no país, a mortalidade materna é de cerca de 452 mulheres, contra 500,1 há 10 anos, o que sugere que muito trabalho ainda há por fazer.  

Em cada mil habitantes, em Moçambique, morrem cerca de 12 pessoas (taxa bruta de mortalidade). Por outras palavras, em 2007 morriam 13,8 pessoas, tendo o número caído para 11,8, em 2017.

No que diz respeito à força de trabalho, a percentagem da população economicamente activa – mão-de-obra disponível para a produção de bens e serviços – aumentou de 69,2 para 57,6 entre 2007 e 2017.

Contudo, relativamente á taxa de dependência demográfica, “em cada 100 pessoas existem cerca de 99 pessoas à espera de outras para as suportar em todas as suas despesas”.

 

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