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A “novela” do passaporte falso que facilitou a fuga de Nini Satar

“Isto é apenas um processo… a moldura penal é só de três meses a dois anos de prisão”. Estas foram as primeiras palavras de Momade Assif Abdul Satar aos jornalistas em “off the record”, pouco antes do início da audiência de julgamento do caso de falsificação do passaporte que permitiu a Nini Satar fugir de Moçambique em 2014, violando a liberdade condicional que lhe tinha sido concedida pela justiça, depois de cumprir 13 anos e meio de prisão por envolvimento no assassinato do jornalista Carlos Cardoso. Dos autos do processo, consta que o passaporte com o qual Nini fugiu foi emitido por Sidália dos Santos, funcionária do Serviço Nacional de Migração (SENAMI), com os dados de Sahim Mommad Aslam, sobrinho de Satar.

Bastante confiante em relação ao processo e fazendo figura de conhecedor da lei, Nini contou ao Tribunal que, após a sua libertação, em 2014, solicitou autorização da 10ª Secção do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo com vista a que lhe fosse emitido pela Migração um passaporte para efeitos de viagem, para tratamentos médicos no estrangeiro. Entretanto, as duas ordens favoráveis da justiça terão sido “desacatadas” pela Migração. É daí que, segundo conta, recebeu ligação de um “alto funcionário do SENAMI” que informou que o seu passaporte não era emitido por ordens da Procuradoria-Geral da República e que, se não fugisse do país, seria morto a tiro no dia 15 de Janeiro de 2015, tal como foram mortos seus “parceiros” Vicente Ramaia, Paulo e Ayoob Satar, irmão mais velho de Nini Satar. Tal funcionário é que terá solicitado que apontasse o nome de um familiar parecido consigo. Nini disse que enviou o nome do sobrinho, Sahim.

E foi com os dados de Sahim que o passaporte foi produzido e Nini fugiu, no dia 10 de Janeiro de 2015, através da fronteira da Namaacha, onde também recebeu ajuda de funcionários do SENAMI para sair do país. Da acusação do Ministério Público, consta que Sidália Esmeralda dos Santos (também arguida no processo de falsificação de passaportes para cidadãos nigerianos) é que terá produzido o documento de viagem. Mas Nini diz que não conhece, nunca viu e jamais terá mantido contacto com Sidália.

O “PAPEL” DE SIDÁLIA
Também Sidália dos Santos nega ter produzido o passaporte falso. Diz que, em Outubro de 2014, já tinha informação, através da Direcção de Migração da Cidade de Maputo, que não devia ser produzido passaporte a favor de Nini. Reconhece, entretanto, que participou do processo de emissão do passaporte de Sahim, mas o documento não tinha fotografia de Nini, conforme o passaporte apareceu quando Nini foi preso em 2018. O que a leva ao banco dos réus é que a sua “password” de acesso às máquinas de produção de passaportes (99999906) aparece como tendo emitido o documento. Ademais, porque à data dos factos era coordenadora de equipa, a sua senha permitia que tivesse acesso a todas as máquinas necessárias para produzir um passaporte. Sidália diz, contudo, que apenas interveio em uma das mais de seis fazes de produção daquele documento.

SAHIM NÃO SABIA QUEO TIO USAVA SEU NOME
Sahim dos Santos é o nome que Nini usava desde 2014 até 2018, quando foi preso no estrangeiro. O nome e os dados que constavam do passaporte são do sobrinho de Nini. Perante o tribunal, disse que não sabia que o seu nome estava a ser usado pelo tio e que mantinha contacto com Nini, quando estava fora do país, mas este nunca o teria informado sobre o assunto. Afirmou que apenas tomou conhecimento através da imprensa, quando o tio foi preso e “ficou muito surpreso e preocupado com a situação”. Entretanto, da acusação, consta que Sahim recebia dinheiro de Nini, tal como aconteceu no ano passado, quando lhe foi dado, a título de empréstimo, o valor de 100 mil meticais.  A audiência de julgamento durou mais de sete horas. No fim, o Ministério Público e a defesa solicitaram que fossem notificados para comparecerem em tribunal três funcionários da Migração, nomeadamente, Esmeralda Lucas, que esteve na captação de dados do passaporte, e Aldo da Costa, que foi responsável pela verificação de dados, um processo que permite ver se a pessoa que solicita passaporte já tem outro ainda válido. A próxima audiência, também na B.O, está agendada para o próximo dia 03 de Maio.

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